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quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

A Guerra do Paraguai em vídeo (II)

O enorme conflito foi analisado neste vídeo do The History Channel, no qual foram ouvidas personalidades dos vários lados do mesmo, sendo de boa qualidade e estando em português. Assistam:



 
 
 
Eu gostei do vídeo, embora discordasse aqui e ali dos entrevistados, mesmo concordando parcialmente com vários deles. Mas, quero deixar aqui sucintamente a minha própria.
Achei e acho, que a Guerra da Tríplice Aliança nunca deveria ter ocorrido, e deveria ter sido evitada com maior empenho pelos vários contendores, algo do qual tratarei melhor oportunamente.
A mesma terminou com o esmagamento do Paraguai, que ao seu final tornou-se apenas uma "terra de ninguém", devastado e humilhado. Porém, ela ocasionou enormes prejuízos econômicos ao Brasil e ainda fortes e amplas perdas humanas (algo como 50.000 brasileiros mortos). A Argentina, a princípio humilhada e invadida, além de pilhada pelos guaranis, em bem menos de um ano teve seu território ocupado espontaneamente evacuado por estes, que por razões militares e políticas bateram militarmente em retirada. E no curso restante da contenda durante aproximadamente quatro anos amealhou grandes capitais vindos do Brasil e ali aplicados em compra de animais de tiro e de tração, carvão para uso dos navios, alimentos para homens e animais, bem como no pagamento de diversos serviços. Um grande negócio, do qual este país e a  elite comercial de seu povo foram os grandes beneficiários. Tais alguns dos resultados dela decorrentes fora o inevitável cortejo maléfico de todas as guerras.
 

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

A Guerra do Paraguai em vídeo (I).


Sobre a Guerra do Paraguai existe o vídeo a seguir, produzido em 2014 pela TV Escola, que é um canal de televisão do Ministério da Educação brasileiro, e que vale a pena ser assistido, pois foi feito em locações externas nos quatro países envolvidos naquela contenda (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai), mostrando cenas deles e ainda boas entrevistas com alguns elementos representativos dos mesmos. E com excelente conteúdo histórico narrando didaticamente a mesma e ainda estando bem ilustrada com imagens de então. Afinal, o tema é bastante controvertido, despertando paixões e clamores mesmo nos dias de hoje, especialmente na terra guarani, sendo este vídeo, que é recente, muito valioso. O mesmo foi dividido em quatro partes.


Assistam a primeira parte:



 
 
 
Assistam a segunda parte:
 
 

 
 
 
Assistam a terceira parte:
 
 
 
 
 
Assistam a quarta e última parte:
 

 
 
 
 
 
Para ultimar quero apenas dizer, que como antes escrevi era essencial evitar-se a guerra antes que ela irrompesse. Penso assim olhando a guerra do seu termino (1870) até o ultimo ano de paz (1864). Da parte de Solano Lopes, tirano guarani, isto seria extremamente improvável, pois ele variava nos seus humores, eventualmente até parecia razoável e ora aqui e ali se mostrava irascível e truculento. Isto ele mostrou nos anos que antecedem o conflito, a partir de 1862, preferindo, porém, nos últimos tempos de paz em radicalizar e endurecer a sua posição política externa. Provavelmente, por sentir-se melindrado com a indiferença brasileira as suas gestões diplomáticas. Seu país era uma dura ditadura, sem constituição, com um parlamento subjugado e apenas nominal, sem órgãos de imprensa fora a oficial, sendo ali inexistente qualquer oposição política. De feitio egocêntrico Lopes era o único centro de decisão e de poder em seu país, ainda não permitindo, que nenhum paraguaio o aconselhasse, ou ao menos opinasse sobre os temas guaranis de governo. Também o Paraguai não mantinha nenhum representante diplomático residente e permanente em nenhum dos estados vizinhos, inclusive no Brasil. Por isto dependia daquilo que o próprio Lopes recolhia de informantes, de uns poucos agentes e de diversos políticos platinos que conhecia. Nosso país há muito mantinha uma legação permanente com um diplomata residente em Assunção, mas não foi feliz na escolha dos dois últimos deles – o encarregado de negócios Caetano Maria de Paiva Lopes Gama e o ministro residente, César Sauvan Viana de Lima; o primeiro, acabou incompatibilizado com Lopes e antes de desligar-se até saiu de Assunção para assim evitar novos atritos; e o segundo, que chegou ao seu posto três meses antes da guerra irromper, tinha pouca familiaridade com o local e as pessoas gradas dali. O político José Antônio Saraiva, que se achava no Uruguai em missão diplomática especial, até aventou a possibilidade de ser credenciado pelo governo para conversações com Solano Lopes, isto meses antes do início do conflito com o Paraguai. Mas, o assunto não teve continuidade, aparentemente por desinteresse do gabinete então no poder, dirigido por Zacarias de Góis e Vasconcelos e cujo ministro do exterior era João Pedro Dias Vieira, sendo possível que isto se devesse a posição oficial, que pregava que o Paraguai nada tinha a ver com fatos ocorridos no Uruguai e relacionados ao Brasil. Algo formalmente correto, que tinha pleno respaldo na legalidade internacional então vigente. O pior foi, que por falta ou imprecisões de informações vindas de nossos diplomatas residentes naquele país, não se levou devidamente em conta os bem anteriores preparativos militares ali feitos (recrutamento e treinamento de grandes contingentes, fabricação e importação de armas e fabricação de pólvora e munições de guerra), o total teor das tenazes intrigas politicas oriundas dos governos "blancos" uruguaios com seu congênere guarani (o Uruguai ansiava por apoio  militar, econômico e político do Paraguai para se contrapor primeiro a Argentina e depois ao Brasil) e as grandes ambições secretamente cultivadas por Lopes e relacionadas aos estados da Bacia do Prata, especialmente a Argentina e ao próprio Uruguai.

 

sábado, 20 de junho de 2015

Uma arvore silvestre deu o seu nome ao Brasil.


Uma árvore silvestre é que deu o seu nome ao país, como todos sabemos. No Oriente o pau-brasil era conhecida como "versino", ou "versil" e a corruptela destas expressões, que eram italianas, acabou se transformando no nome atual.
 
 
 
(Pau Brasil)
 
 
Pau-brasil (Caesalpinia echinata) é uma árvore da família das leguminosas, a mesma do pau-ferro e da sibipiruna ou falso-pau-brasil. Frondosa e de lento crescimento, atinge até trinta metros de altura. Dá flores pequenas e amarelas, vermelhas no centro e levemente perfumadas, que se agrupam em cachos nas extremidades dos ramos e desabrocham de setembro a dezembro. Há espinhos esparsos no tronco, nos galhos e, de forma mais concentrada, junto aos pecíolos das folhas bipinadas, isto é, compostas por duas fileiras de 15 a 20 folíolos com 8 a 18mm de comprimento. O fruto é uma vagem, pequena e revestida de espinhos, que encerra várias sementes. Os índios o conhecem como ibirapitanga, muirapiranga ou arabutã.  O seu nome tupi de imbirapi'tanga composto de imbira' que tem fibra, que tem filamento e + pi'tanga = vermelho, cor de cobre.
 
 
 
(flores desta arvore)
 
 
O pau-brasil tornou-se raro no litoral brasileiro pela ilimitada ganância de portugueses e piratas de outras nacionalidades em mais de três séculos de exploração. Usada na Europa para a extração da substância corante brasileína, sua madeira, ao lado de papagaios e araras, foi uma das primeiras exportações brasileiras.

A madeira do pau-brasil, ao ser exposta toma coloração bem vermelha, é dura e resistente à umidade. Já foi muito usada em obras finas de marcenaria, como arcos de violino, e na construção naval. O corante, extraído por infusão da madeira reduzida a pó, permite a obtenção de tonalidades variadas, do vermelho-claro ao quase preto, e serviu principalmente para tingir tecidos até meados do século XIX, quando caiu em desuso após a descoberta das anilinas e outras tintas sintéticas. Nos séculos XVII e XVIII, o pau-brasil teve posição de destaque no comércio internacional e se popularizou nas designações em outras línguas, como "bois de brésil", em francês, e "brazilwood", em inglês. Na terra de origem era conhecido também como pau-de-pernambuco, pau-vermelho, pau-rosado e pau-de-tinta.

O pau-brasil era comum em larga faixa litorânea, entre os estados do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Norte, dispersando-se eventualmente para o interior, até Minas Gerais e Goiás. A própria nau que levou ao rei D. Manoel a notícia do achamento da ilha de Vera Cruz, sob o comando de Gaspar de Lemos, carregou para Lisboa alguns toros de pau-brasil.
 
(uma das naus do descobrimento)
 
 
Pouco depois a sua existência foi constatada pelo piloto florentino Américo Vespúcio, que acompanhou a expedição de Gaspar de Lemos de 1501. Na viagem de 1503, Américo Vespucio chegou até provavelmente a Cabo Frio, aonde levaram os expedicionários 5 meses, carregando as naus de pau-brasil.
 
 
(Américo Vespúcio)
 
 
No ano seguinte começou a exploração comercial do produto, com os contratos do pau-brasil, que consistiam em arrendamentos de terras da colônia a exploradores, que se comprometiam a devastar novas áreas e edificar feitorias fortificadas. Um dos primeiros arrendatários foi Fernando de Noronha, a quem a coroa portuguesa doou a ilha de São João, mais tarde designada por seu nome.



(Ilha Fernando de Noronha - vista atual)

Naqueles tempos a madeira era vendida no exterior por 2 e meio ducados o quintal, posto que em Lisboa, custava aos arrendatários só meio ducado. Sabe-se que os arrendatários levavam de nossa terra todos os anos 20 mil quintais de pau-brasil. O pau-brasil era então a única fonte de renda da colônia, a que emprestou seu nome poucos anos depois do descobrimento suplantando as várias denominações efêmeras, que figuraram em mapas, cartas e atos oficiais do começo do século XVI.

A generalização do tráfico de pau-brasil por navios espanhóis e franceses, que Portugal não conseguiu reprimir, levou ao estabelecimento das capitanias hereditárias e, com elas, ao monopólio da coroa portuguesa sobre a madeira, oficializado a partir de 1532. Neste longo período, além da atividade dos portugueses, contribuíram para dizimar o pau-brasil o domínio holandês no Nordeste e as incursões francesas no litoral fluminense, onde a árvore teve presença marcante na região de Cabo Frio. Renovado pelo império brasileiro após a independência, o monopólio estatal durou até 1859, quando as reservas naturais da espécie já estavam comprometidas a fundo.

E se as arvores rarearam e muito durante estes séculos de sua predação pelos homens ambiciosos, o seu nome estendeu-se a todo o território nacional e assim perdura até hoje.



 
 
 

Fontes: 
 
FROTA, Guilherme de Andréa. 500 ANOS DE HISTÓRIA DO BRASIL. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército. Edição 2000.

Wikipédia, a enciclopédia livre. http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/pau-brasil/pau-brasil-3.php#ixzz1wvPY0qwl
. Acesso em: 13/02/2015.
 

Wikipédia, a enciclopédia livre. http://igorwanderleyy.blogspot.com.br/2012/06/constituicao-historica-do-nordeste.html  Acesso em: 13/02/2015.

quarta-feira, 29 de abril de 2015

Floriano Peixoto visto por um contemporâneo.

Velhos e bons livros acabam esquecidos em prateleiras de bibliotecas e por causa disso bons textos deixam de vir ao conhecimento público como aliás já escrevi antes. Pensando nisto reproduzo este fragmento de um deles, que se vê a seguir, com o devido crédito, para assim divulga-lo aos que porventura leiam este blog.
Este contemporâneo foi o contra-almirante Custódio José de Mello, da Marinha do Brasil, que por um certo tempo foi aliado de Floriano, e por outro lapso temporal seu adversário.
                                                     
(Custódio de Mello)

Estes conceitos pertencem aquele autor, foram extraídos de obra publicada em seu nome, e são os seguintes:
 


 
"(Tal) foi a herança que os governos transatos transmitiram ao governo do Marechal Floriano Peixoto.

                                                       
(Floriano Peixoto)

O General, a quem fora confiado tão oneroso legado não possuía, é certo, muitas das qualidades, — cujo conjunto forma o verdadeiro estadista, tão necessário, aliás, na quadra momentosa em que ele assumiu o governo do país —, para por si só levar aos espíritos a confiança e a convicção de que não longe estariam dissipadas as densas e negras nuvens que toldavam os horizontes da pátria.
                                                         

(Palácio do Itamaraty-sede da presidência então)
 
De sua fé de ofício consta que, quando 1° Tenente do corpo de artilharia, comissionado no posto de Capitão, foi por ordem superior, em 1865, incorporar-se às forças em operações no Rio Grande do Sul, invadida pelo Exército Paraguaio, que ocupava a cidade de Uruguaiana.

Daquela data até 1870, época em que teve termo a campanha contra o Paraguai, conquistou por atos de bravura os postos de Capitão e Major, sendo no fim da guerra promovido a Tenente-Coronel do corpo de estado-maior de primeira classe.

De então, em diante, até 1889, quando exerceu o lugar de Ajudante General do Exército no posto de Brigadeiro e depois no de Marechal de campo, à exceção de uma comissão sem importância alguma científica, qual a de escolher o local, em que, na capital da ex-província de Alagoas, deveria ser construído um barracão destinado a servir de depósito de artigos bélicos, e organizar as respectivas plantas e orçamentos, como a de posteriormente dirigir as obras militares da mesma ex-província, (verdadeira sinecura por falta absoluta de tais obras), salvante, ainda a Presidência da ex-província de Mato Grosso, a qual exerceu ele somente durante um período eleitoral, em todo o mais tempo esteve sempre em serviço puramente militar na capital do extinto Império e nas de algumas de suas províncias.

Destarte, como oficial do estado maior de 1ª classe com o curso de engenharia militar, o Marechal Floriano Peixoto, se tinha habilitação nessa profissão, não teve ocasião de revelá-las, e, como militar, se dispunha de conhecimentos táticos e estratégicos, também nunca os revelou, porque na Guerra do Paraguai, onde poderia tê-los posto em prática, apenas chegou ao posto de Major, patente que não lhe dava direito senão, quando muito, a comandar batalhão; além de que, por índole, por cálculo, por aversão às discussões, por incompetência, ou por outro qualquer motivo, nunca discutia, por mais importantes que fossem as questões sujeitas à sua apreciação. Para prova deste asserto, basta relembrar que, Presidente do Senado, não presidiu ele um só dia a seus trabalhos a pretexto de moléstia; o que, entretanto, em 23 de novembro de 1891 ainda doente para presidir as sessões do Senado, não o impediu de assumir nesse mesmo dia o governo do país, como Vice-Presidente da República, cargo relativamente de maiores trabalhos e incômodos para um enfermo. Mas é que lá era ele obrigado, não podia fugir ao dever de interpretar, de estabelecer premissas e tirar conclusões, de raciocinar, de discutir enfim, e cá esse dever lhe era facultativo, podia discutir ou deixar de fazê-lo, de sorte que nem por esse lado se pôde formar juízo sobre sua inteligência e aptidões. Por outro aspecto, porém, militar brioso, valente, honrado, fiel cumpridor de seus deveres, severo em seus costumes, com prestígio no Exército conquistado por seus princípios de moralidade, de disciplina e de justiça, bem intencionado, como todos o supunham, e cercado de bons e dedicados auxílios, o Marechal Floriano Peixoto prometia um governo patriótico, refletido, moralizado e honesto, capaz de levar o país a altos destinos.

De feito, jamais entre nós um governo foi recebido pela nação debaixo de melhores auspícios; viam todos despontar com ele um futuro rico de esperanças e de salvadoras promessas, e a imprensa de norte a sul festejou, quase uníssona, com efusão de delirante contentamento, o advento dessa era regeneradora, criada pelo esplêndido triunfo da revolução de 23 de novembro de 1891, que reivindicou nossos direitos conculcados pela mais audaciosa tirania.

Por esse tempo sabia-se, é verdade, que no dia 15 de novembro de 1889, ocupando o Marechal Floriano Peixoto, como já dissemos, o lugar de Ajudante General do Exército, posto da maior confiança militar, na ocasião em que o General Deodoro da Fonseca, à frente das forças revoltosas, havia assestado a artilharia contra o quartel-general onde estavam reunidos o Ministério e as forças legais ao mando do referido Ajudante General Floriano Peixoto, a alguém este dissera ser impossível qualquer ataque a essa artilharia, postada em posição de facilmente varrer a metralha toda e qualquer investida contra ela. E porque, tal escutando o Presidente do Conselho de Ministros, o Visconde de Ouro Preto, lhe replicasse que, no Paraguai, os soldados brasileiros se haviam apossado de artilharia em piores condições, redarguiu-lhe o Ajudante General do Exército nestes termos: "Mas lá tínhamos em frente inimigos, e aqui somos todos irmãos".

O Visconde de Ouro Preto, que até a esse momento valorosamente lutava expedindo ordens com o vigor e o desassombro inspirados na confiança sem limites depositada em seu Ajudante General — o qual, horas antes ainda lhe assegurava sua dedicação e fidelidade, bem como a das tropas a seu mando —, aturdido, como se uma bomba estourasse bem perto de seus ouvidos, sentindo ao mesmo tempo penetrar-lhe até o intimo d'alma o veneno sutil das víboras humanas em traiçoeiro bote, incontinente pediu ao Imperador a demissão coletiva do Ministério.
 
                                                       
(Deposição do gabinete - Benedito Calixto - fragmento da tela)
  
Mas o público, em geral, repeliu a insinuação de tão infame procedimento, pois este não se coadunava com os precedentes honrosos de uma larga vida de sacrifícios e desinteresses. O povo só quis ver no imprevisto da repentina resolução a influência do amor de classe, a imperar em favor dela, entre o sacrifício de tantas vidas preciosas, de irmãos ou camaradas, e a queda das instituições monárquicas, que, afinal de contas, não eram as únicas capazes de felicitar a nação brasileira.

Robustecia também essa opinião o fato de ter, pouco antes da revolução, em 17 de julho, o Marechal Floriano Peixoto, já no exercício do alto cargo de Ajudante General do Exército, escrito ao chefe de Polícia de então Dr. José Basson de Miranda Osório, a carta que em seguida transcrevemos, e na qual ele manifestava a maior dedicação, o maior interesse e zelo pela pessoa do ex-Imperador, que sempre lhe galardoou os serviços com munificência régia, e a quem ele se devotava com o mais profundo reconhecimento.

Com efeito, os sentimentos expressos nessa carta revestiam a traição de tão negras cores que, para admiti-la, fora mister considerar seu autor um ente abominável, hediondo, capaz de todas as torpezas, de todas as indignidades, contra o que em vivo e enérgico protesto se levantava um passado sem mácula, toda uma vida de irrepreensível correção.

Entretanto, no espírito do observador cauteloso e prevenido, no daqueles que julgam todos os homens sujeitos a fraquezas quando solicitados por paixões mais ou menos fortes, — ou no dos que, por longa experiência diante de certos fatos observados à luz das tendências do espírito humano através de embriagadoras tentações, se habituaram à desconfiança —, implantou-se a dúvida, que ao futuro ficou reservado desvendar.

Eis a carta à qual nos referimos:

"Exmo. amigo Dr. chefe. O nosso Imperador, bem que estimado e venerado, deve ser vigiado de perto por certo número de amigos de toda confiança, que façam sustar todo e qualquer desacato.

Sei que V.Exª. tomará as medidas precisas, mas eu quisera secundá-lo com um pequeno mas forte contingente, que entender-se-á com as autoridades de serviço.

Se aceitar esse concurso, peço que a começar de hoje remeta-me um bilhete de cadeira e duas entradas gerais, todas as vezes que S.M. tenha de assistir a representações teatrais.

Com V. Exª. irá entender-se o meu delegado.

De V. Exª. amigo velho e obrigado."

   Floriano Peixoto. "
 
 
 


 
Fonte: MELLO, Custódio José de. O Governo Provisório e a Revolução de 1893, edição póstuma, 1.° volume. São Paulo: Companhia Editora  Nacional. Edição 1938.
 
 
 
 
 
 
 


Não custa nada se recordar, que Floriano Vieira Peixoto, oficial-general do exército, traiu ao governo imperial e ao Imperador D. Pedro II, quando do pronunciamento militar de 15 de novembro de 1889, conforme discorri neste mesmo blog, no texto <A Monarquia Brasileira em 1889 estava assentada em areia (IV).>. Com isto granjeou as simpatias do novo regime, ao qual serviu, primeiro como ministro, depois como vice-presidente, e finalmente como presidente da república em exercício. Com a sua saída do poder terminou a chamada "República da Espada", de predomínio militar, iniciando-se a "República Oligárquica", com Prudente de Moraes e seus sucessores. No texto de sua autoria antes transcrito trago mais alguns conceitos sobre esta figura histórica, mesmo sem esquecer que provém de um adversário político dele. Valem, claro, ao menos como testemunho de um contemporâneo, que com ele conviveu. As imagens não pertencem ao texto original, sendo por mim aqui acrescentadas.

 
 

 

 

domingo, 12 de abril de 2015

A última carga a cavalo, em combate, da Cavalaria Brasileira.

(Osório, o patrono da cavalaria brasileira, de lança em punho e seus comandados)

 

"A última grande carga de cavalaria do Exército Brasileiro, num conflito externo, foi realizada pela 4.ª Brigada de Cavalaria no final da Guerra do Paraguai (1865-1870), na fase denominada “Campanha das Cordilheiras", na batalha de Campo Grande (ou Acosta – Nhú, ou ainda Nhú – Guazú como a chamam os paraguaios) travada em 16 de agosto de 1869.
 
Após a batalha de Peribebuy, o Exército Brasileiro, sob o comando do Conde d’Eu, parte em perseguição do Exército Paraguaio, em direção a Caraguatay, no nordeste do Paraguai, em busca de uma batalha campal onde pudesse aniquilar o inimigo e por fim à guerra.
 
Pela estrada de Caacupé – Caraguatay marcha o grosso do Exército Brasileiro, integrado pelo 1.º Corpo de Exército do Gen. José Luís Mena Barreto e pela 3.ª Divisão de Cavalaria do Cel. Vasco Alves, sob o comando do próprio Conde d’Eu. Realizando um amplo movimento pelo flanco direito, numa perseguição paralela à do 1.º Corpo de Exército e a cavaleiro da estrada Barrero Grande – Caraguaty, marcha o 2.º Corpo de Exército do Gen. Vitorino, procurando cortar a retaguarda do inimigo.
 
Por volta das 08:00 h do dia 16 de agosto de 1869, a vanguarda do 1.º Corpo de Exército choca-se com o 2.º Corpo de Exército paraguaio do General Bernardino Caballero, forte de 6.000 homens, num vasto campo denominado Nhu – Guazú.
 
O 1.º Corpo de Exército brasileiro, após reconhecer o dispositivo inimigo e desdobrar suas forças, lança-se ao combate, empregando sobre o centro paraguaio a sua infantaria, protegida em seus flancos pela cavalaria. O inimigo recua, batendo-se em retirada, oferecendo tenaz resistência, sem perder, contudo, sua formatura nem deixar de responder com sua artilharia.
 
Pouco depois das 08:00 h, o 2.º Corpo de Exército brasileiro atinge a região onde se juntam as estradas Caacupé – Caraguaty e Barrero Grande – Caraguaty. Sua vanguarda choca-se com um destacamento paraguaio que protegia o flanco da força principal inimiga. Após breve combate os paraguaios são forçados a retroceder em direção a Nhu-Guazú.
 
Por volta das 10:00 h o 2.º Corpo de Exército brasileiro apresenta-se no campo de batalha de Campo Grande, incidindo no flanco do grosso paraguaio. O Gen. Vitorino lança parte de suas forças num movimento desbordante, procurando atingir a retaguarda do inimigo e cortar a retirada paraguaia.
 
Ao pressentir a chegada do 2.º Corpo de Exército brasileiro e percebendo o movimento que este fazia para cercá-lo, o General Caballero, fazendo um último e supremo esforço, decide lançar sua reserva no combate, no intento de liberar a estrada para Caraguaty e permitir a retirada do Exército Paraguaio. O furioso e derradeiro contra-ataque do inimigo choca-se com o destacamento do General Mallet (do 2º C Ex) integrado pela 1ª Brigada de Cavalaria e pela Brigada de Infantaria Resin, apoiado por oito canhões.
 
 Neste momento, por volta das 12:00 h, a 4.ª Brigada de Cavalaria (2.º C. Ex.), sob o comando do Cel. Hipólito Ribeiro, integrada pelo 10.º Corpo de Cavalaria do Ten. Cel. Chagas e pelo 24.º Corpo de Cavalaria do Ten. Cel, Isidoro, forte de 600 homens, havia transposto o córrego Peribebuy e colocara-se à esquerda do destacamento do Gen. Mallet, que recebia o impacto do contra-ataque paraguaio. O Cel. Hipólito Ribeiro, percebendo a posição vantajosa de sua brigada e procurando aproveitar a oportunidade que se apresentava, conduz a 4.ª Brigada de Cavalaria em uma violenta carga contra a retaguarda paraguaia, destroçando o contra-ataque inimigo e aniquilando o último esforço do Gen. Caballero, contribuindo, assim, decisivamente para o final da batalha.
 
 O General Dionísio Cerqueira, que participou da campanha como alferes e tenente e foi testemunha ocular da carga da 4.ª Brigada de Cavalaria na batalha de Campo Grande. Em seu livro “Reminiscências da Campanha do Paraguai”, narra com detalhes este fato:
 
 "Tiroteávamos cerrado, quando vi o bravo Alferes Firmino entusiasmado dando vivas ao Coronel Hipólito. Era uma brigada de cavalaria, que transpunha o passo, comandada pelo heroico chefe. Avançava na frente o piquete do príncipe, com o Capitão João Teles, seu comandante. Era de arrebatar! Aquela força magnificamente montada, avançava a galope sobre as linhas paraguaias, que se uniram e foram rapidamente apoiadas por uma grossa coluna cerrada, que surgiu de trás de um capão e não formou quadrado. Do galope à carga foi um momento. Fuzilávamos os paraguaios quase de flanco. Ao lado do Teles, ia, firme nos estribos, revoluteando a lança, um cabo do piquete. Que valente! Vi-o meter as esporas no cavalo e, com um salto enorme, penetrar naquela massa eriçada de baionetas. Ainda deu duas lançadas e sumiu-se. Após a carga, os esquadrões voltaram a formar-se. Nesse momento, os paraguaios investiram a baioneta sobre os nossos cavaleiros, que ganharam distância e voltaram a carregar".
 
 Com o desastre do contra-ataque da reserva, os remanescentes do 2.º Corpo de Exército paraguaio põem-se em fuga desordenadamente, sendo completamente destruídos pelos brasileiros. O Exército paraguaio deixou no campo de batalha cerca de 2.000 mortos, 1.500 feridos, 100 extraviados, vinte e três canhões e seis bandeiras.
 
 Na batalha de Campo Grande ocorreu o aniquilamento do Exército Paraguaio. Encerrado o combate, o Exército Brasileiro reiniciou sua perseguição ao Marechal Lopes, presidente paraguaio, travando pequenos combates, até que em 1º de março de 1870, consegue cercá-lo e destruí-lo no combate de Aquidaban ou Cerro – Corá, encerrando a longa guerra.
 
 
(Batalha de Campo Grande - tela de Pedro Américo)
 
O 10.º e 24.º Corpos de Cavalaria da 4.ª Brigada de Cavalaria pertenciam à Guarda Nacional do Rio Grande do Sul (Reserva ou 2ª Linha do Exército Brasileiro), instituição criada pela Regência, que prestou relevantes serviços ao País até o início da República. Seus integrantes usavam, em sua grande maioria, trajes gauchescos; poucos tinham o fardamento regulamentar. Os oficiais eram armados (de) revolver Nagant e as praças de pistola. Todos usavam espadas e lanças.
 
 Em determinada passagem de seu livro “Reminiscências da Campanha do Paraguai, o General Dionísio Cerqueira assim descreve uma tropa da Guarda Nacional do Rio Grande:
 
 “Quando me fui postar à frente do meu contingente, aproximava-se da casa uma força de cavalaria da guarda nacional do Rio Grande. Montavam todos a brida, com as pernas estendidas e a ponta do pé apenas tocando o estribo.”  Fizeram alto e apearam. Havia oficiais, inferiores e soldados.
 Alguns tinham barbas longas que lhes desciam até o peito e cabelos trançados que chegavam quase à cintura. Seu guisamento era digno de nota: longas adagas de fortes punhos com virotes em cruz e bainhas de prata lavrada; pesadas chilenas também de prata, com tão longos copetes que lhe chegavam aos artelhos, e cossouros de tal diâmetro que lhes dificultavam a marcha; chapéu de feltro de abas estreitas, cobertos de ganga vermelha e presos por barbicachos de borla à ponta do nariz; bombachas vermelhas ou negras e ponches de bicunha de cores vivas ou de outros estofos bordados a seda e agaloados; espadas de ferradura, com três dedos de largura; lanças imensas de conto de prata ou aço polido, de choupa longa e brilhante, com galhos direitos ou em meia-lua invertidas, os cornos pontiagudos voltados para cima e para baixo, que mais pareciam lâminas de corseques e parta sanas alemães; um par de pistolas à cinta, na pistoleira, que era a larga guaiaca, espécie de balteo coberto de chaparias e moedas, onde guardavam onças e libras de ouro, patacões e bolivianos de prata. Os cavalos tinham as crinas tosadas em cogotilho e as colas atadas. Cada um tinha em cima um montão de prataria lavrada. As cabeçadas com grandes meias-luas nas testeiras; as rédeas de bomba ou passadores chatos ou esféricos; as bridas de fortes caibas, florões e copas, os largos fiadores de chapas ou filigranas, os buçais, os cabrestos, as cabeças dos serigotes, os estribos do século dezesseis, de grande picaria com longos bocais cilíndricos ou faceados, as cantoneiras das caronas de pele de tigre, os rabichos e os peitorais; tudo era de fina prata lisa ou cinzelada. Sobre os lombilhos e serigotes, pelegos negros cobertos por uma badana e sobrecincha de couro de lontra, de veado ou cinchões escarlates bordados e frangeados. Todos tinham boleadeiras, umas de marfim, outras de ferro retovadas de couro, presas debaixo dos pelegos do lado da garupa.
 Em muitos, viam-se laços trançados presos a cinchador por um tento de lonca. Poucos traziam pendurados na argola da sugigola ou no peitoral a chaleirinha do mate. Era um quadro pitoresco. Havia altos e robustos, claros, de olhos azuis e cabelos alourados; outros morenos, musculosos, de cabeleiras negras e lisas e barba rarefeita; alguns de lábios grossos, dentes alvos, maçãs do rosto salientes, nariz achatado e cabelos cacheados caindo sobre os ombros. “Um ou outro negro.”
 
 Após a Batalha de Campo Grande a cavalaria participou de pequenos combates e escaramuças, onde foram envolvidos efetivos inferiores a esquadrão. Pela natureza do terreno e dos combates que se travaram no final da guerra, os Regimentos e Corpos Provisórios não puderam mais ser empregados como um todo, não tendo oportunidade de realizar as cargas vibrantes e arrojadas que caracterizaram suas ações em toda a campanha.



(bandeira imperial)

A carga da 4ª Brigada de Cavalaria, no final da batalha de Campo Grande, constitui-se, assim, em fato memorável para a Arma de Cavalaria, pois foi a última vez que forças a cavalo do Exército Brasileiro, com efetivo superior a esquadrão, realizaram uma carga de cavalaria, influindo decisivamente num combate de grandes proporções."

 
Fontes de consulta:
 
 - História da Guerra entra a Tríplice Aliança e o Paraguai: General Tasso Fragoso.
 - Reminiscências da Campanha do Paraguai: General Dionísio Cerqueira.
 - Dicionário das Batalhas Brasileiras: Hernâni Donato.
 - Uniformes do Exército Brasileiro: J. Washt Rodrigues e Gustavo Barroso."
 
 
Fonte do texto principal:

WILEMBERG, Leandro Sicorra.  http://www.decavalaria.com/index.php/coisas-de-cavalaria/historias/74-a-ultima-carga-a-cavalo-em-combate-da-cavalaria-brasileira . Acesso em: 28/01/2014.



O texto é de terceiro, aqui devidamente identificado, e de minha parte deixo aqui esta imagem atual do Regimento Osório, do EB, aquartelado em Porto Alegre-RS, aonde ainda hoje se cultuam as tradições da romântica arma. Vejam:



(Regimento Osório - imagem atual)



E vejam ainda na imagem abaixo militares da cavalaria brasileira durante a Guerra do Paraguai (1865-1870). Da esquerda para a direita:

1. Oficial da Cavalaria Gaúcha, com uniforme militar padrão das unidades do sul do País;
2. Oficial das unidades de cavalaria que vieram do Rio de Janeiro;

3. Lanceiro Gaúcho, com o típico "poncho" usados pelos cavaleiros dos Pampas;
4. Infantaria Montada ou Carabineiros. Unidades militares de Infantaria regular que andavam a cavalo. Geralmente eram Escaramuçadores e unidades de Infantaria Leve;

5. Soldado das unidades de cavalaria que vieram do Rio de Janeiro;
6. Outro lanceiro gaúcho, com um poncho azul.


 
 
                                                                                
 
 
 
 


Destaque-se apenas que as imagens não constavam do texto original e que as palavras ali contidas foram transcritas como se achavam naquele, inclusive citações com regionalismos da época.
 
 
 
 

 
 

segunda-feira, 23 de março de 2015

A Monarquia Brasileira em 1889 estava assentada em areia (IV).

(Marechal Deodoro da Fonseca)
                                                                          
Mas, prosseguindo, já pelas três horas daquela mesma tarde, na presença de uns poucos republicanos e de um reduzido número de basbaques apressadamente reunidos pelos primeiros, na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, ainda presente o vereador José do Patrocínio, foi efetuada uma sessão e ali aprovada uma moção lavrando-se ata, tudo alusivo ao evento militar, que foi levada ao Marechal Deodoro em sua casa. Vale a pena reproduzi-la e com a grafia da época:

"Cerca de 3 horas da tarde, chegou ao mesmo edificio o sr. vereador José do Patrocinio, acompanhado do povo e immediatamente foi votada a seguinte representação: "Exms. srs. representantes do exercito e da armada nacionaes - Temos a honra de communicar-vos que, depois da gloriosa e nobre resolução que ipso facto depoz a monarchia brazileira, o povo, por orgãos espontaneos e pelo seu representante legal nesta cidade, reunio-se no edificio da camara municipal, e, na fórma da lei ainda vigente, declarou consummado o acto da deposição da monarchia e, acto seguido, o vereador mais moço, ainda na forma da lei, proclamou, como nova forma de governo do Brazil, a Republica. Attendendo ao que, os abaixo assignados esperam que as patrioticas classes militares sanccionem a iniciativa popular, fazendo immediatamentae decretar a nova fórma republicana do governo nacional".

Algo, que tinha valor meramente político, embora fosse este bem pequeno, sendo de duvidosa legalidade e ainda distorcendo a realidade. De qualquer forma, aquela moção acabou sendo um dos ingredientes daquela salada feita as pressas, pois na verdade o que se fizera na secretaria da guerra fora uma mera "quartelada", com uns poucos republicanos presentes e sem nenhuma influência nos acontecimentos, fora alguns elementos curiosos do povo apenas observando a distância e com cautela a toda aquela movimentação anormal.

Mas, de qualquer forma a pequena moção camarista apareceu naquelas horas tumultuadas e por isto ingressou na história pátria. O principal mesmo foi que Deodoro, tenha sido seriamente instado por vários camaradas militares, que temiam futuras represálias aos oficiais rebelados da parte do estado monárquico. Aventou-se, em especial, que naquele mesmo dia o desagradou profundamente a menção ao nome de um velho adversário pessoal e político, como o futuro presidente do conselho de ministros (o primeiro ministro da época), sendo ele o prócer gaúcho, Gaspar da Silveira Martins, que estaria no momento em cogitação na área palaciana imperial. E, ainda, que isto foi a última gota d'agua, que o levou aquela decisão, o que aliás é perfeitamente crível, face a inimizade capital entre ambos. Quaisquer, que tenham sido as razões ele acabou na noite do dia 15 de novembro por concordar com a proclamação da república e assinou o decreto número 01, em nome de um improvisado governo provisório, auto criado e nomeado as pressas, fazendo nascer a república federativa e dando outras providências para a dissolução do estado abolido.

Por ai se vê, que a república foi feita em duas fases, sendo a inicial uma manobra de demonstração de força totalmente militar, tanto que, na conclusão desta perante o último gabinete de ministros do império e ainda na Secretaria de Guerra, o velho marechal fez um emocionado discurso a Ouro Preto dizendo-lhe: "Vossa Excelência e seus colegas estão demitidos por haver perseguido o Exército". "Quanto ao imperador", concluiu, "tem a minha dedicação, sou seu amigo, devo-lhe favores: seus direitos serão respeitados e garantidos." Também afirmou na ocasião, que encaminharia uma lista de nomes do futuro ministério a D. Pedro II. E de República, nada ele falou. Mais  claro, impossível!

E a outra orbitada em interesses de facções, preconceitos e sentimentos pessoais, anseios de poder de teóricos republicanos, uma pitada de política, tudo finalmente formalizado de maneira meramente cartorial, mas sempre girando do princípio ao fim em torno do velho marechal, face ao seu grande prestígio perante as tropas da guarnição carioca, estando os poucos republicanos brasileiros e todos os militares do Rio e seu entorno a ele totalmente submetidos.

Destaque-se, que ao menos parte da inércia militar do governo Ouro Preto durante o singular confronto entre forças do mesmo exército se deveu a silenciosa e traiçoeira atuação do Marechal Floriano Peixoto, então a segunda figura em importância no Ministério da Guerra, e que no curso da repressão fazia o trabalho de chefe do estado-maior, o qual embora do mesmo partido de Ouro Preto e por ele recentemente promovido aquela patente, a partir de certo momento traiu totalmente ao governo. Para isto, ele que até então o apoiava  passou a manobrar a tudo de maneira a esconder do primeiro-ministro Ouro Preto importantes dados, que já possuía e em seguida a reduzir ao mínimo qualquer reação governamental a sedição, sem deixar de mostrar solidariedade ao cabeça do governo, ao qual iludiu descaradamente, só mostrando-lhe parte de sua face desleal nos últimos momentos, que antecederam a queda do gabinete.




(Marechal Floriano Peixoto)


Isto ocorreu, quando o  primeiro-ministro dentro do Q.G. queria que os canhões das tropas de Deodoro fossem tomados à força de baionetas. "No Paraguai, os nossos soldados apoderaram-se da artilharia em piores condições" , disse Ouro Preto a Floriano. "Sim, mas as bocas no Paraguai eram inimigas, e aquelas que Vossa Excelência está vendo são brasileiras, e eu sou, antes tudo, um soldado da nação." Foi ali, que ele mostrou a sua verdadeira feição, que até então escondera com real habilidade artística do crédulo e iludido Ouro Preto.

 
No dia seguinte, D. Pedro II e familiares, foram oficialmente notificados a deixarem o país, e estando politicamente desprestigiado e totalmente sem apoio militar, o imperador e seus parentes se submeteram ao mesmo, deixando o Rio para o exterior num velho navio de passageiros, o Alagoas, para na sua quase totalidade nunca mais aqui retornar. 

 
Na oportunidade, respondendo a notificação recebida, manifestou-se o ex-imperante por escrito:



“A vista da representação escrita, que me foi entregue hoje, às 3 horas da tarde, resolvo, cedendo ao império das circunstâncias, partir, com toda a minha família, para a Europa, deixando esta Pátria, de nós tão estremecida, à qual me esforcei por dar constantes testemunhos de entranhado amor e dedicação, durante quase meio século em que desempenhei o cargo de chefe de Estado. Ausentando-me, pois, com todas as pessoas de minha família, conservarei do Brasil a mais saudosa lembrança, fazendo os mais ardentes votos por sua grandeza e prosperidade.
Rio de Janeiro, 16 de novembro de 1889.
D. Pedro de Alcântara
.”
 
 

 
 
                                                        
 
 
 
 
 
                                                          
                                                                                                                    

(Paço imperial da cidade - imagem atual)
 
 
 
No velho prédio do Paço da Cidade aqui retratado, aonde se encontrava reunida a Família Imperial e de onde eles saíram para embarcar, deu-se o último ato daquele drama, felizmente sem sangue. O local só era usado para eventos públicos e oficiais, tendo D. Pedro e esposa vindos de Petrópolis e a princesa e o marido do Paço Isabel (hoje Palácio Guanabara), ali se reunindo premidos pelas inesperadas circunstâncias. Também ali, eles viveram seus dois últimos dias no Brasil.
 
Lamentavelmente, ressalto, que durante o primeiro dia houve grande inércia no campo monarquista, que se imobilizou, aliás, por culpa do próprio imperador, que ficou aparentemente indiferente ao que ocorrera, e embora já estivesse no Rio, centro de tudo, ali permaneceu boa parte do tempo entretido em leituras e sem buscar atender as solicitações e sugestões da princesa Isabel, só acedendo a algumas delas quando já era muito tarde.
 
Naquelas poucas horas a melhor saída estava em chamar Deodoro ao palácio para um diálogo entre ele e o imperador, que teria tido pleno êxito, pois o velho marechal adorava o monarca. Sobre isto aquele militar refletindo na mesma data sobre esta hipótese disse então: "Se eu for, o velho chora, eu choro também, e está tudo perdido". Mostrando assim, como seria fácil a D. Pedro se impor naturalmente aquele antigo e dedicado servidor do Estado monárquico. A inércia imperial consequentemente facilitou, que alguns militares e civis republicanos mais audazes tornassem vitorioso o movimento sedicioso, conforme antes relatei. No fundo estava certo Nabuco de Araújo, quando disse depois: "instituições que não se defendem, abdicam". Foi o que se deu com a monarquia brasileira, cujo chefe como se vê abdicou por duas vezes.

 
 
 
 
 
                                                                                                                

(a Família Imperial em 1889)




Olhando hoje aqueles acontecimentos achei bem curioso, que no dia 15 de novembro foi que tudo começou e também em que tudo terminou, como num bom espetáculo de teatro. E, que vários de seus participantes mostraram-se excelentes atores. Cito, como exemplos, o Marechal Floriano Peixoto, que sempre fora um exímio dissimulador, excedendo-se neste papel e com isto ajudando a derrubar a monarquia, José do Patrocínio, que era "isabelista" e subitamente virou republicano, o major Sólon Ribeiro, que pensou bem antes de se comprometer, e quando começou a faze-lo, mostrou extrema astúcia espalhando na véspera vários boatos para açular a soldadesca, etc.

 

E a população carioca como assimilou as grande novidades políticas então ocorridas? Durante o decorrer do dia 15 de novembro, ao que se depreende, sem saber o que realmente ocorrera e ignorando inclusive o que logo viria, até que o povo comum as recebeu aparentemente bem, provavelmente satisfeito pela forte humilhação sofrida pela nada popular classe política, consistente na truculenta destituição do gabinete. Tanto que, naquele dia e até a noite muitas pessoas desfilaram agrupados atrás de bandas de músicas militares, como então se fazia, aparentemente felizes com o ocorrido.

 
Fora isto houve um desfile anterior, comandado pessoalmente pelo Marechal Deodoro, realizado imediatamente após a deposição ministerial, e efetivado em cortejo pelo centro da cidade. Seu objetivo era comemorar o sucesso do empreendimento e ao final dele ir até o Arsenal da Marinha, pois parte da tropa que o acompanhava era da Marinha e ali iria ficar. "Os cariocas olhavam uns para os outros pasmados, interrogando-se com os olhos sem dizer palavra", narrou o dramaturgo Arthur Azevedo, que viu o cortejo militar, ainda acrescentando, que “na Rua 1.º de Março a passeata desfilou em silêncio”. Chegando ao  Arsenal da Marinha, Deodoro constatou que lá inexistia reação contrária ao que se fizera e em seguida mandou que seus soldados voltassem aos seus quartéis, recolhendo-se ele próprio ao seu lar.

 

E o restante da população carioca como reagiu então e logo depois do golpe militar? Para Aristides Lobo “o povo assistiu àquilo bestializado, atônito, surpreso, sem conhecer o que significava. Muitos acreditaram seriamente estar vendo uma parada!”  (cf. artigo escrito no dia 15, e publicado no "Diário Popular",  de  São Paulo, em 18 de novembro de 1889). Note-se, que ele era partidário da república e participou do primeiro ministério republicano, como titular da pasta do Interior, aonde ficou só por pouco mais de  dois meses, face a profundas divergências com o Marechal Deodoro.
 
                                                                                                                                              
(desfile no R.J. com Deodoro à frente no dia 15 de novembro)

O próprio antes referido Artur Azevedo sobre isto escreveu na imprensa:

 
“Durante os dois primeiros dias da República, notava-se em muitos semblantes a consternação e mesmo o terror; a população, caminhando vagarosa, melancolicamente, parecia oprimida por um peso moral, por uma dor estranha e violenta. Só se agitava alegre essa patuléia que aplaude indistintamente a vitória de todos os partidos !”  (cf. artigo por ele chamado “croniqueta”  e que foi publicado na revista “A Estação”,  em 19 de novembro de 1889).

 

E a partida da Família Imperial foi objeto de manifestações populares pró ou contra ela? O deposto D. Pedro e família deveriam  ter partido no dia 17 de novembro, durante o dia, mas saíram na madrugada deste dia, por imposição do governo provisório, que alegou temer que estudantes iriam promover uma arruaça contra aqueles em seu embarque diurno, havendo o risco deles serem “metralhados”, tal como narrou Gastão de Orleans, que pareceu ter-se atemorizado com isto. Não é de se crer, que civis tivessem acesso a metralhadoras, que já existiam, sendo elas grandes e usadas em reparos instalados nos navios brasileiros de guerra, mas é claro totalmente inacessíveis aqueles jovens, que nem saberiam como remonta-las e usa-las numa área urbana. O que faz supor, que o governo não queria, é que manifestantes populares ou da elite favoráveis a deposta Coroa fossem deles se despedir afetuosamente.

 
                                                         

 (O pano baixou inesperadamente....!!!)





 
Quando disse, que foi o piparote de um anão, que a derrubou, levei em conta, que o governo Ouro Preto reunira uma tropa de 1000 militares (chamada de brigada mista), para bater os 500 revoltosos, fora outros elementos militares e policiais também dispostos dentro e nas imediações da secretaria da guerra.
 
Mas, neste amplo efetivo totalizando 2000 homens haviam os indiferentes e ele ainda estava minado por descontentes, o que explica porque praticamente quase todos eles aderissem aos rebelados, inclusive com uma parte saudando a Deodoro com muitos vivas, marchas militares e garbosas continências, quando ele vaidosamente desfilou a cavalo diante da soldadesca reunida no interior da Secretaria da Guerra.
 
Claro, o descontentamento deles com o sistema era preexistente aquele confronto, mas certamente Floriano Peixoto, valendo-se de seu alto e estratégico cargo no ministério, foi decisivo para acabar de derruir qualquer intento de resistência, que porventura ainda existisse.
 
Curioso é que, a Igreja Católica, que também ajudara a derrubar a monarquia e a D. Pedro II, ela já durante a república foi claramente desprestigiada por esta, que separou o estado da igreja e por consequência, liberando o culto público das demais confissões, privou o catolicismo oficial de salários, rendas e recolhimento de taxas a ela assegurados durante a monarquia. Mas, a presença de Deodoro na presidência do governo provisório e especialmente a dos demais maçons na assembleia constituinte explicam tudo isso, pois nem o velho militar, nem os seus irmãos maçons não esqueceram a hostilidade a sua grei da parte da igreja. Vê-se por isto, que foi um tiro pela culatra aquele dado pelos clérigos, em suas ações contra o então monarca, D. Pedro II, e que realmente veio a produzir todos os seus efeitos  durante a república, ali os ferindo bem fundo em seu prestigio, em sua aceitação popular e ainda financeiramente.
 
Foi assim, em não muitas palavras, que sobrepondo-se ao império, nasceu uma república em nosso país, que por ser filha ilegítima e prematura, correu o risco de se extinguir pouco depois, com o levante federalista no Sul e a Revolta da Armada no Rio (1893). Mas, ela sobreviveu, amoldou-se aqui e acolá, saiu mesmo de cena por certo tempo, o que ocorreu especialmente em boa parte da Era Vargas e vive até hoje, já passados 125 anos o melhor que consegue.
 
Quero deixar claro, que busquei aqui resumir o mais possível os fatos então ocorridos, que envolveram uma multiplicidade de pessoas e ocuparam um razoável lapso de tempo, entre os seus antecedentes e o grande final deles, buscando apenas me ater as primeiras figuras daquele drama nacional e ainda aos fatos realmente primordiais.
 
Particularmente, creio que a república não veio a nós naturalmente, mas foi imposta artificial e prematuramente por muito poucos e nasceu frágil, ilegítima e só, pois seus pais (os militares sediciosos e os próceres republicanos) mal se conheciam e o que era pior, também não se entendiam entre si. Ainda, a república nasceu de uma mera união de interesses entre homens, uns agindo por necessidade de se acautelarem no futuro, e outros, por mera ideologia teórica, não havendo em nenhum deles, nem amor, nem paixão pela nascitura. Por isto ela padeceu tanto e seus padecimentos se estenderam por todos os brasileiros, ainda acarretando num certo tempo grandes e desnecessárias despesas para o erário nacional (mormente durante a Revolta da Armada).
 
Formalizada pela constituição de 1891 ela morreu em outubro de 1930. E dela brotou a Era Vargas, que apesar de alguns pontos positivos, também foi passível de muitas criticas. Mas, paro por aqui, pois também sou republicano e a prezo bastante, desejando que ela se consolide cada vez mais e que ainda muito mais prospere nos tempos que ainda virão.



 
 
 
                                     (brasão republicano inicial)

 

 

                                          

 

 

                                                FIM

 

 
 


 

 
 
 
 
 
 
 
 
















































 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 


BIBLIOGRAFIA

 

 
 BUARQUE DE HOLANDA, Sérgio (org.); QUEIROZ, Suely Robles Reis de et al.  HISTÓRIA GERAL DA CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA. O BRASIL MONÁRQUICO: DECLÍNIO E QUEDA DO IMPÉRIO. Tomo II e seu 5.° volume. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil. Edição 1985.
 

BUARQUE DE HOLANDA, Sérgio (org.); ELLIS, Myrian et al.  HISTÓRIA GERAL DA CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA. O BRASIL MONÁRQUICO: DECLÍNIO E QUEDA DO IMPÉRIO. Tomo II e seu 4.° volume. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil. Edição 1995.

 
FROTA, Guilherme de Andréa. 500 ANOS DE HISTÓRIA DO BRASIL. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército. Edição 2000.

 
 
SENA, Ernesto. DEODORO: SUBSÍDIOS PARA A HISTÓRIA. Brasília: Conselho Editorial do Senado Federal. Edição 1999.

 
SILVA, Hélio. 1889: A REPÚBLICA NÃO ESPEROU O AMANHECER. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. Edição 1972.

 
SILVA, Ana Cláudia Suriani da. AS CRONIQUETAS DE ARTUR AZEVEDO. http://revistas.iel.unicamp.br/index.php/remate/article/viewFile/3799/3256 . Acesso em: 27/09/2014.
 
 

VEJA EDIÇÃO ESPECIAL: REPÚBLICA - 20/11/1889. http://veja.abril.com.br/historia/republica/indice.shtml . Acesso em: 28/09/2014.